Publicação Pagina do Nortão
Foto – Reprodução
No coração do Pará, um pedaço de terra vermelha e acidentada se tornou, nos anos 1980, o centro das atenções do Brasil e do mundo. Conhecida como Serra Pelada, essa pequena serra localizada no município de Curionópolis foi palco de uma das maiores febres do ouro da história contemporânea — um capítulo marcante e controverso da trajetória brasileira.
A Descoberta que Mudou Tudo
O ano era 1979 quando um lavrador chamado Genésio Ferreira da Silva encontrou fragmentos de ouro em sua propriedade. A notícia se espalhou como pólvora e, em pouco tempo, milhares de homens começaram a migrar para o local com pás, picaretas e uma única esperança: enriquecer da noite para o dia.
No auge da corrida, mais de 100 mil garimpeiros ocuparam a região, formando um cenário caótico e impressionante. O que era uma área isolada da floresta amazônica virou um formigueiro humano, com filas intermináveis de homens suados, cobertos de lama, carregando sacos nas costas, sonhando com a fortuna escondida nas entranhas da terra.
A Vida no Garimpo
A rotina em Serra Pelada era brutal. Sob o sol escaldante, os garimpeiros trabalhavam até a exaustão, escavando barrancos e removendo toneladas de terra à mão. Muitos viviam em condições precárias, sem acesso a água potável, saúde ou segurança. A região foi tomada por barracos improvisados, prostíbulos, comércio informal e uma violência quase constante.
Mesmo assim, o sonho do ouro mantinha a multidão em movimento. A cada pepita encontrada, mais pessoas chegavam. A cada decepção, alguns desistiam, mas muitos insistiam.
O Comando de Curió
Diante do caos crescente, o governo militar decidiu intervir. Nomeou o coronel Sebastião Curió para administrar a área. Curió organizou o garimpo, proibiu o uso de maquinários pesados (para impedir a concentração de poder nas mãos de poucos), e instituiu um sistema de controle rígido — ao mesmo tempo em que foi acusado de repressão e autoritarismo.
Apesar das críticas, foi sob sua liderança que o garimpo viveu seu auge e também seu declínio.
Ouro, Ilusão e Tragédia
Serra Pelada foi o palco de muitas histórias extraordinárias. Homens simples que encontraram pepitas do tamanho de um sabão em barra, outros que enriqueceram do dia para a noite — e muitos mais que morreram na miséria, vítimas da ganância alheia, dos desabamentos e das doenças.
Estima-se que mais de 50 toneladas de ouro tenham sido extraídas da região em poucos anos. Mas a maior parte dessa riqueza não ficou com os garimpeiros. Intermediários, atravessadores, empresários e autoridades lucraram muito mais do que os que suaram e sangraram no barro da serra.
Um Ícone Imortalizado
O fotógrafo Sebastião Salgado eternizou Serra Pelada em imagens impressionantes, que rodaram o mundo. Seus registros em preto e branco mostravam a dimensão humana daquele garimpo: corpos em fila, olhos esperançosos, pés descalços subindo encostas de terra.
A força simbólica das fotos transformou a Serra em ícone da desigualdade e da ambição humana.
O Fim da Corrida e o Legado
Nos anos 1990, o ouro começou a rarear. O governo intensificou a fiscalização e as mineradoras industriais assumiram o controle da área. O garimpo foi desativado e os garimpeiros expulsos. Muitos voltaram para suas cidades de origem; outros ficaram na região, tentando sobreviver com o pouco que restou.
O legado de Serra Pelada é profundo. Ainda hoje, há disputas judiciais sobre direitos minerários, indenizações e o impacto ambiental deixado pelo garimpo. O lago que se formou na cratera escavada é silencioso, mas guarda ecos de gritos, sonhos e tragédias.
Memória e Reflexão
Serra Pelada não foi apenas um garimpo. Foi um espelho do Brasil: um país de riquezas naturais imensas, mas de injustiças profundas. Um país onde muitos trabalham duro, mas poucos prosperam. E onde o sonho do ouro, apesar de brilhante, pode esconder um preço alto demais.
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